lisboa,

por rafaelabraga

Se um dia estivesse frente a frente com Marília Gabriela – um objetivo de futuro próximo; e ela me encurralasse num desses bate bola: LISBOA!, eu teria na manga uma infinidade de rebotes: ladeira, cor, sol, Pessoa, comida, comida boa. A primeira, e mais certeira, no entanto, seria “intuitiva”. Explico. Não sou das melhores pessoas no quesito localização, mas também não sou das piores. Tenho uma boa memória, dessas entre a normal e a fotográfica, nem 8 e nem  80, algo no 63.  Acontece que tampouco estive na cidade, coisa de duas horas e trinta minutos, e já me sentia quase um heterônimo de Fernando Pessoa; Álvaro de Campos, caso possa escolher. Lisboa é intuitiva.

“ÀS ARMAS”, trecho do hino português, poderia, ao meu ver, ser  substituído pela máxima (ou pelo menos, a minha máxima) “AO SUL”. Caso você se perca pelas tantas ladeiras do Bairro Alto ou Alfama, siga ao sul.  Ao sul está o Tejo. E o Tejo é o lugar dos reencontros. Caso você se confunda, siga para o Tejo, se reencontre, e prossiga.

A questão não é exatamente essa. Embora essa seja uma parte importante da questão.  O segundo dia da viagem foi reservado para ir a Belém, o bairro. Como é sugerido por todos os gurus, um dia todo. Não seria difícil de chegar a pé, a Torre está na beira do Tejo, é só seguir o bendito, o lugar dos reencontros, como disse. Porém aí vem a parte boa de se viajar a baixo custo, ou como se diz em management, minha seara, low cost: escolher  por qual meio de transporte público se aproveita melhor a cidade. Quem não caça com City Tour, caça com elétrico. Para o trajeto da ida, escolhi o tram, 15E, ele segue em linha reta pela, erm, orla, e apenas se circuncentra quase perto do bairro. Na volta, escolhi o ônibus, 728, que faz um outro trajeto, subindo e descendo ladeiras, passando pelo Cais de Sodré e chegando a região central. Brilhante.

728. Entrei. Sentei. Sobe ladeira, desce ladeira. Entra turista, sai turista. O motorista não fala inglês, os turistas não falam português, me senti na interseção. Pela primeira vez, talvez. Casal de amigos se aproxima; digo, amigos entre eles, não meus amigos. Noto um cochicho, uma coisa ali, outra colá. Sigo na minha. Pá, tchum, motoca, que não calculou bem as curvas sinuosas e estreitas do Chiado, trava o autocarro. E abre-se aí a brecha para o papo, pois não há situação constrangedora que envolva ambas as partes que a intimidade não aflore.

“Peça uma curtida para tua página, faz-te famosa” “Shh calma” “Oi”, interpelei. Existe a necessidade de economia do pacote de dados, mas a curiosidade antropológica foi, é e sempre será maior. “Qual página?” – saquei o celular. “Meus cozinhados Margarete Almeida, procura aí, ela está a publicar diversas receitas, todos os dias”, “Meus cozinhados Margareth…”; não achei. “É Margarete, isso com E, na Angola é assim, tente” já tomando conta do meu teclado. “Achei, pronto”. E, num ato ousado, a Margarete procurou a si mesma e fez um convite de amizade, que foi aceito ali mesmo, entre um ponto e outro. “Agora curte a minha página” “Ok, manda” “Tailor cooking”, já na certeza que cometeria algum erro, dei para o próprio se achar. “Ok, feito”.

Vou confessar, sem muito orgulho, que tenho um jogo pessoal de testar a popularidade das nossas coisas. Em geral só pergunto sobre o Vasco da Gama, mas esse contexto, vá lá, pedia outra coisa. “Chefs brasileiros, conhecem? Atala, Rizzo?” “Não” “Talvez ouvi falar, mas não. Conheço acarajé e moqueca, serve? Gosto de cozinhar, é parecido com nossas raízes angolanas” “Ô se serve”

 

Praça do Comércio. Minha parada.

Tchau,

Tchau.

Prazer –  e lancei essa, sem saber se me ia fazer compreendida.

Hoje a Margarete preparou uma paelha à valenciana, tripas à moda do Porto e mousse de tiramisu, como consta um post no meu feed de notícias do facebook, às 15:46.